sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

O doce ativismo de Clarice Lispector.

Mãe de Pedro e Paulo, esposa de embaixador por 15 anos, cuidadora de Ulisses (seu cãozinho), jornalista, escritora não profissional (como gostava de ser identificada) de romances, crônicas, contos, de colunas com temáticas femininas (atividade independente do percurso literário) e viajante do mundo por consequências do destino. Clarice não nasceu no Brasil, mas ai de quem com ela discutisse sua afirmação de identidade brasileira pernambucana! Dizem que era uma presença marcante, que chamava à atenção de  todos os olhares em qualquer ambiente. Linda, tão somente. E com o olhar perdido, embora marcante. Teceu as linhas de tantas outras vidas em páginas em branco através de sua companheira máquina de escrever, e tentou se salvar da própria escuridão, mergulhando na escrita à procura de si mesma. Bruxa e hermética para alguns, carregava a fama de obscura para quem a olhava do lado de fora das paredes de sua casa; mas bastava abrir as portas de seu lar para que jovens a considerassem encantadoramente delicada e sublime. 

Como eu a queria ter conhecido! 

Clarice, como toda mulher, deu conta em vida de milhões de funções, espalhando sua essência por cada canto que passava. Contudo, não bastasse se eternizar através da Literatura, Lispector se engajou politicamente durante a II Guerra Mundial e se inscreveu nas linhas históricas do país fazendo parte da tropa brasileira. A escritora não pegou em armas, destacou-se servindo à Força Expedicionária Brasileira - a FAB dispondo-se ao trabalho voluntário no corpo de enfermagem, um dos mais altos postos que uma mulher podia se permitir na década de 40 num exército e sociedade ainda profundamente sexista e patriarcal. 

Poderá nossa autora ser para sempre lembrada e amada como ''uma caixinha de música meio desafinada'' nesse mundo em que o desamor faz tanto estrondo e o silêncio da solidão é tal que nem o pensamento pensa. 


segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

O mundo através dos olhos de Clarice Lispector


Minha escritora favorita. (Não é clichê, acredite).

Desde adolescente me ocupo com Clarice Lispector nas horas vagas, tristes, felizes; absolver sua escrita é um constante desafio, por isso estou sempre lendo e (re)descobrindo seus romances. Eu não me recordo quando ou como foi que surgiu minha afeição pela autora, mas acredito que meu interesse aflorou quando uma professora universitária (de Letras, da UFRJ) me elogiou em público na Bienal do Livro, porque eu a fiz uma pergunta relacionando o conteúdo da palestra ao romance ''Água Viva''. Eu devia ter uns 15 anos e estava ainda no ensino médio; em minha escola quase nunca referenciavam a escritora que eu considerava ser fundamental para o repertório literário de qualquer estudante. Uma pena. Quis mudar esse quadro; coloquei como meta o desenvolvimento de algum trabalho que pudesse ressaltar aos olhos dos meus alunos as obras de Lispector, e foi na Sala de Leitura do Colégio Universitário Geraldo Reis que trabalhei com o Projeto Clarice, ao lado de uma grande amiga, a Mary Hilário.

A principal meta da Sala de Leitura em que trabalhei sempre foi estimular o hábito da leitura e o aperfeiçoamento da escrita, a partir da diversidade de autores e temáticas (é um espaço rico, que deveria existir em todas as escolas do país). Dentro dessa perspectiva, a ideia principal do Projeto Clarice era estabelecer um diálogo entre as turma de diferentes segmentos - 3º, 5º e 8º ano - a partir de diferentes gêneros literários de Clarice Lispector, a fim de aproximar os alunos da sua literatura. A turma combinou que, ao final do curso, haveria um processo de registro de todas as atividades feitas para ficarem expostas nos corredores da escola. 

O primeiro retorno material do trabalho desenvolvido foi a montagem de um mural coletivo, elaborado pelas três turmas.








Em seguida, elaboramos uma oficina de pintura em azulejo inspirada nas pinturas em tela que Clarice fazia. Segundo a autora, essa expressão artística era uma outra forma de se estabelecer no mundo.


Por fim, conseguimos criar uma revista literária com a produção escrita dos alunos das 3 turmas participantes do projeto.



O crédito do sucesso do nosso projeto e da produção do conteúdo da revista é também dos alunos, que se envolveram e mergulharam no universo clariceano.

Inspirado no livro infanto-juvenil de Lispector “Como nasceram as estrelas?”, Matheus, da turma 501, produziu este e tantos outros textos que compuseram a revista literária.
"Bem antigamente havia uma nave e dentro dela tinham inventado uma máquina que quando você  pedia uma coisa, ela multiplicava. Um dia, um homem pediu uma coisa muito esquisita, ele disse que era com cinco pontas e brilhante e inventou um nome para esta coisa: estrela. Quando ele pediu a máquina multiplicou e tinha tanta estrela dentro da nave que o homem teve que jogar para o céu e como o céu não tem fim, as estrelas também não.".