terça-feira, 6 de novembro de 2012

Persona

     Procuro - e acho! - em Clarice algumas expressões do sentimento que me é único, embora comum a cada ser em sua vasta solidão: o desalento. E penso que há de existir alguma forma de proteção da exposição crua e fria do coração, que palpita contundente chegando à face com tamanha transparência. Logo, abro meu livro de crônicas e como em uma íntima conversa, minha querida autora leva-me ao antigo teatro grego e refere-se aos atores cujas faces eram protegidas por máscaras, a fim de que se protegessem de seus próprios e genuínos sentimentos tão íntimos e particulares.
     A crônica Persona¹ transfigura um método para se ser sem exposições. Esse é, talvez, o melhor meio de desviar-se  do caminho da desilusão: esconder-se através de uma máscara que retire seu coração da vitrine.


" Mesmo sem ser atriz nem ter pertencido ao teatro grego - uso uma máscara.Aquela mesma que nos partos de adolescência se escolhe para não se ficar desnudo para o resto da luta.
Não, não é que se faça mal em deixar o próprio rosto exposto à sensibilidade. Mas é que esse rosto que estava nu poderia, ao ferir-se, fechar-se sozinho em súbita máscara involuntária e terrível. É pois, menos perigoso escolher sozinho ser uma pessoa. Escolher a própria máscara é o primeiro gesto voluntário humano. E solitário."


¹ Clarice na cabeceira: crônicas / Clarice Lispector; organização de Tereza Monteiro. pp. 125 -129. RJ, Rocco, 2010.